Artículo de Revision

Doença do Tronco da artéria Coronária Esquerda e Doença de Múltiplos Vasos. Novas evidências 2015

Dr. Marcelo Halac

Médico Investigador. Congreso de la Nación. Clínica Sagrada Familia Argentina , Buenos Aires

DoenÇa de tronco da artéria coronária esquerda

Introdução

A descrição da relevância da estenose complexa do Tronco da artéria Coronária Esquerda (TCI) Não Protegido da árvore coronária foi realizada há mais de um século. O Dr. James B. Herrick descreveu a história clínica de um paciente de 55 anos de idade que faleceu por um choque cardiogênico após 52 horas de um quadro agudo. Na autópsia foi encontrada uma extensa área de necrose do ventrículo esquerdo associada com a obstrução total do Tronco da artéria Coronária Esquerda por um trombo formado sobre uma placa aterosclerótica. A explicação para semelhante necrose baseia-se na magnitude do miocárdio em risco entre os pacientes que apresentam uma doença de TCI. Está demonstrado no cenário habitual com dominância direita (mais de 80% dos casos) que a artéria Coronária Esquerda fornece a irrigação de aproximadamente 84% do tecido.

Características próprias da Doença de TCI

Por um lado, a prevalência da doença de TCI nas angiografias em geral atinge uma cifra próxima a 5% (1 de cada 20) i. Mas quando é analisado o que acontece com os pacientes com Síndrome Coronária Aguda, cabe mencionar, a maioria dos pacientes aos que é indicado uma coronariografia, a cifra sobe a 25% (1 de cada 4) ii. Enquanto à estratégia de revascularização, há algumas décadas assistimos a instalação da Cirurgia de Revascularização Miocárdica em comparação com o tratamento clínico (ensaios CASS, europeu), quando foi demonstrado que a intervenção cirúrgica melhorou substancialmente a sobrevida dos pacientes no médio e longo prazo. iii
Por outro lado, em 1977, o Dr. Andreas Grüntzig realizou a primeira angioplastia transluminal coronária (ATC) de uma artéria coronária. De maneira chamativa, um de seus primeiros casos, o 4° para ser mais exato, estava relacionado com a ATC de um TCI efetuada no dia 24 de novembro de 1977, em Frankfurt, com sucesso. De acordo com o que foi reportado (cita NEJM) o paciente faleceu subitamente quatro meses mais tarde. iv Ao revisar a literatura poderemos encontrar trabalhos pioneiros da ATC de Tronco como os trabalhos de O’Keefe e Hartzler v onde se observou:

 

Qual é a evidência atual na Revascularização de TCI?

Quando foram incorporados dispositivos, na definição de novas estratégias e indicações dentro da prática médica é comum observar inicialmente um grande entusiasmo que depois atinge um patamar, que posteriormente decresce e, finalmente, começa a ser refletido no contexto de uma definição mais sutil. Entendo que hoje este é o ponto para onde nos dirigimos após as hipóteses emanadas de sub-ensaios (sem poder estadístico) do Ensaio Clínico SYNTAX. O Ensaio SYNTAX foi realizado com uma definição que o fortaleceu notavelmente como relação à casuística publicada anteriormente: foi realizado sobre todos os pacientes que chegavam aos centros sem critérios de elegibilidade. O único necessário era um acordo dos profissionais responsáveis sobre as duas estratégias possíveis, cabe dizer, tinham que ser operáveis e passíveis de serem submetidos à angioplastia.
Nos 705 pacientes ingressados neste ensaio, nos quais foi encontrada uma lesão de TCI, foi observado que não existem diferenças empregando uma ou outra estratégia. No entanto, este ensaio aportou um elemento interessante na avaliação de risco dos pacientes: o Escore de SYNTAX. O que acontece quando são analisadas as populações em função do escore de risco?

 

 

 

Como é observado nos pacientes com escores ≤32 não existem diferenças significativas entre a ATC e a CRM. Se aos resultados da subanálise de TCI do SYNTAX adicionamos os emergentes de ensaios mais recentes como o PreCOMBAT, Le Mans e o de Boudriot (n=1611), observaremos que após 1 ano não houve diferenças significativas com relação ao MACCE e que foi mantido o que foi reportado no SYNTAX com relação à maior prevalência de AVC entre os operados (OR 0.15, 0.03-0.67, p=0.01) e a maior necessidade de revascularização entre os submetidos à angioplastia (OR 2.25, 1.54-3.28, p<0.001). vi
Por outro lado, já sabemos há muito tempo que a revascularização completa pressupõe uma melhor evolução em termos de eventos clínicos. Desta afirmação surgiu o conceito do Escore residual de SYNTAX. Aqueles pacientes com valores mais elevados (>8) deste escore têm uma evolução mais tórpida com relação à taxa de eventos (aproximadamente 35% comparado com 10-11%). vii

Que tanto inclui a incorporação do IVUS e/ou do FFR como estratégia mandatória da ATC de TCI?

O Dr. SJ Park mostrou evidência no sentido de que o emprego do IVUS é um indicador independente de risco de morte após 3 anos na ATC de TCI (HR 0.429, 0.211-0.872, p=0.019). E isso é assim somado a pontos tão fortes e ao mesmo tempo tão simples de compreender como ter Insuficiência Cardíaca prévia, Insuficiência Renal, EPOC e/ou Euroscore ≥6. Dito em termos simples, ter insuficiência cardíaca prévia, por exemplo, é um indicador de maior risco de morte. Não utilizar IVUS na ATC de TCI também. Paralelamente, o Dr. Park mostrou que se for realizada FFR para a ATC de TCI são menos frequentes as ATC de artéria Descendente Anterior e, mais contundentemente, as de artérias Circunflexa e Coronária Direita; da mesma maneira assinalou como é menor a taxa de utilização de dois stents comparado com apenas um. viii

Os resultados com os quais contamos hoje são suficientes para definir qual é a melhor estratégia?

Não. Todas as evidências disponíveis surgem de subensaios ou de ensaios com baixo número de pacientes. Devemos esperar os resultados nos próximos meses de dois ensaios clínicos que estão muito avançados: o EXCEL e o NOBLE.

Nas guias europeias publicadas há alguns meses é assinalado que naqueles pacientes com Doença de Tronco de artéria Coronária Esquerda e Escore de SYNTAX <22>

 

DOENÇA DE MÚLTIPLOS VASOS

Aqui a situação é um pouco diferente porque há muitos anos foram comparadas ambas as estratégias, embora convenhamos que por se tratar de duas opções em permanente evolução é dificultoso por um ponto de corte estrito.
Quase 30 anos depois de uma hegemonia da Cirurgia de Bypass (CRM) no tratamento destes pacientes com Doença de Múltiplos Vasos (EMV) começaram as publicações dos primeiros ensaios de ATC comparado com CRM (1993: ERACI e RITA; 1994: GABI, EAST; 1995: CABRI; 1996: BARI). Somente como observação metodológica, devo assinalar que nestes ensaios houve uma seleção significativa dos pacientes incluídos (foram incluídos aproximadamente 4-5% dos pacientes avaliados, algo mais de 15% no ERACI). A estes primeiros ensaios com balão e baixa taxa de utilização de stents onde foi observado que não houve diferenças significativas com relação à Morte/IAM, mas sim com relação à necessidade de revascularização, seguiram ensaios em seu momento muito representativos como o ARTS, SoS e o ERACI II.

Novamente considero oportuno citar a evidência mais interessante que temos hoje que compara a estratégia cirúrgica comparado com a revascularização com stents farmacológicos. Os Ensaios SYNTAX, como foi assinalado anteriormente, evitaram cair na tentação de definir critérios de inclusão e de exclusão, motivo pelo qual o único acordo que devia existir era sobre a factibilidade de ambas as estratégias. Deste ensaio foram extraídas observações muito enriquecedoras. Assim sendo, observou-se que o número de stents colocados e a longitude dos segmentos nos quais foram colocados os stents eram superiores aos reportados na casuística prévia até aquela data.

 

 Quando foram comparados os MACCE após 5 anos entre a CRM e a ATC, foi observada uma diferença a favor da cirurgia como é mostrado no seguinte gráfico:

 

No entanto, ao analisar qual foi a evolução em função do Escore de SYNTAX prévio, foi possível observar que nos pacientes com um Escore ≤22 não houve diferenças significativas entre operar ou realizar uma angioplastia nestes pacientes. iv

A evidência é um dogma?

Uma breve digressão antes de passar às conclusões desta análise. O Dr. David L Sackett (OC, MD, FRSC, FRCP), Professor Emérito em Epidemiologia Clínica & Bioestatísticas da McMaster University, em Hamilton, Ontario, Canadá, considerado o “mentor” da Medicina Baseada na Evidência, assinalava em 1996: “A Medicina Baseada na Evidência (MBE) está constituída pelo emprego consciente, explícito e prudente da melhor evidência disponível para a tomada de decisões sobre o tratamento individual dos pacientes. A prática da MBE se baseia na integração da experiência clínica individual com a melhor evidência clínica externa disponível após uma investigação sistemática. Entende-se por experiência clínica a competência e o juízo crítico adquiridos através da experiência e a prática clínica.”
“Qualquer guia externa deve ser analisada conjuntamente com o estado clínico do paciente e as suas preferências.”
Interessante o concepto vinculado com a preferência do paciente, principalmente quando são comparadas duas estratégias com resultados equivalentes em certos pacientes.

O que poderíamos concluir?

Com relação à Angioplastia na Doença de Tronco de artéria Coronária Esquerda:

  • A estenose do Tronco de Coronária Esquerda Não Protegida tem uma prevalência relativamente elevada e expõe os doentes a um alto risco de eventos cardiovasculares.
  • Tecnicamente, sua revascularização endovascular é factível com uma alta taxa de sucesso –sua complexidade está vinculada com a lesão de bifurcação quase exclusivamente - e deve ser confrontada com o risco do paciente de ser operado cirurgicamente.
  • Os resultados do SYNTAX no seguimento após 5 anos sugerem que a angioplastia com stents de 1° geração é igualmente segura a uma CRM nos pacientes de baixo e moderado risco.
  • * A estratégia para a revascularização estratégica ótima continua em profundo debate à luz dos novos desenvolvimentos tecnológicos. Os resultados dos ensaios EXCEL e NOBLE permitirão lançar luz sobre os aspectos fundamentais.
  • É essencial atender também os aspectos técnicos como são a abordagem decidida para o tratamento da bifurcação (estratégia provisional), a técnica de otimização proximal, e o emprego de métodos complementares como o FFR e o IVUS.

Com relação à Angioplastia na Doença de Múltiplos Vasos:

  • A Doença de 2 vasos com comprometimento da artéria Descendente Anterior é beneficiada pela estratégia intervencionista.
  • Os pacientes com Doença de Múltiplos Vasos de Baixo Risco (Escore≤22) podem ser submetidos à angioplastia com similar eficácia e segurança em relação à cirurgia.
  • Aspectos tais como a fragilidade e a preferência do paciente devem ser considerados nos casos borderline.

Referências

i Stone PH, Goldschlager N. Left main coronary artery disease: review and appraisal. Cardiovasc Med. 1979;4:165-77
ii Kotsia A, Brilakis ES, Held C, Cannon C, Steg GP, Meier B, Cools F, Claeys MJ, Cornel JH, Aylward P, Lewis BS, Weaver D, Brandrup-Wognsen G, Stevens SR, Himmelmann A, Wallentin L, James SK. Extent of coronary artery disease and outcomes after ticagrelor administration in patients with an acute coronary syndrome: Insights from the PLATelet inhibition and patient Outcomes (PLATO) trial. Am Heart J. 2014;168:68-75.e2.
iii Chaitman BR et al. Am J Cardiol. 1981 Oct; 48(4):765-77 iv Gruntzig AR. Transluminal dilatation of coronary-artery stenosis. Lancet 1978 Feb 4;1(8058): 263 v O’Keefe JH Jr, Hartzler GO et al. Left main coronary angioplasty: Early and late results of 127 acute and elective procedures. AHJ Volume 64, Issue 3, 15 July 1989, Pages 144–147
vi Capodanno D et al. JACC 2011, 58: 1426-32 vii Farooq V et al - The Negative Impact of Incomplete Angiographic Revascularization on Clinical Outcomes and Its Association With Total Occlusions - The SYNTAX (Synergy Between Percutaneous Coronary Intervention with Taxus and Cardiac Surgery) Trial - JACC Vol. 61, No. 3, 2013 viii Park SJ – TCT 2014
ix 2014 ESC/EACTS Guidelines on myocardial revascularization - The Task Force on Myocardial Revascularization of the European Society of Cardiology (ESC) and the European Association for Cardio-Thoracic Surgery (EACTS) – Windecker S et al - European Heart Journal (2014) 35, 2541–2619

 

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